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Friedrich Engels foi mais do que um segundo violino para Karl Marx

Friedrich Engels comemora hoje seu aniversário de 200 anos. Devemos lembrar a profunda influência exercida por ele sobre seu camarada, Karl Marx, bem como suas próprias contribuições jornalísticas e teóricas para formular a estratégia da revolução socialista pelas ruas e urnas ao mesmo tempo.

Friedrich Engels compreendeu, antes mesmo de Karl Marx, a centralidade da crítica da economia-política. Na verdade, quando os dois radicais começaram a se conhecer, Engels havia publicado muito mais artigos sobre este assunto do que seu amigo.

Nascido há 200 anos, no dia 28 de novembro de 1820, em Barmen, Alemanha (hoje um subúrbio de Wuppertal), Friedrich Engels era um jovem promissor. Seu pai, um industrial têxtil, negou-lhe a oportunidade de estudar na universidade. Em vez disso, orientou seu filho no meio de sua empresa. Engels, um ateu, era autodidata e tinha um apetite voraz por conhecimento. Ele assinava seus artigos com um pseudônimo para evitar conflitos com sua família conservadora e fortemente religiosa.

Os dois anos que passou na Inglaterra – para onde foi encaminhado aos 22 anos de idade para trabalhar em Manchester nos escritórios da algodoeira Ermen & Engels –, foram decisivos para o amadurecimento de suas convicções políticas. Foi lá que ele observou pessoalmente os efeitos da exploração capitalista sobre o proletariado, da propriedade privada e da competição entre indivíduos. Ele fez contato com o movimento cartista e se apaixonou pela trabalhadora irlandesa, Mary Burns, que desempenhou um papel fundamental em seu desenvolvimento. Engels era um jornalista brilhante. Ele publicou relatos na Alemanha sobre as lutas sociais inglesas, além de escrever para a imprensa de língua inglesa sobre os avanços sociais em curso no continente. O artigo “Esboços de uma crítica à economia política”, publicado nos Anuários franco-alemães em 1844, despertou grande interesse em Marx, que na época decidira dedicar todas as suas energias ao mesmo assunto. Os dois iniciaram uma colaboração teórica e política que duraria o resto de suas vidas.

A influência de Engels
Em 1845, Engels publicou seu primeiro livro em alemão, The Condition of the Working Class in England (A Situação da Classe Trabalhadora na Inglaterra). Como enfatizava o subtítulo, esse trabalho se baseava “na observação direta e em fontes genuínas”. Engels escreveu no prefácio que o conhecimento real das condições de trabalho e de vida do proletariado era “absolutamente necessário, pois será capaz de fornecer uma base sólida para as teorias socialistas”. Em sua dedicatória introdutória, “Para a classe trabalhadora da Inglaterra”, Engels destacou ainda que seu trabalho “no campo” deu a ele de modo direto e não abstrato, “conhecimento da vida real dos trabalhadores”. Nunca foi discriminado ou “tratado por eles (trabalhadores) como estrangeiro” e ficou feliz ao ver que estavam livres da “terrível maldição da estreiteza e arrogância nacional”.

No mesmo ano em que o governo francês expulsou Marx por causa de suas atividades comunistas, Engels o seguiu até Bruxelas. Lá, eles publicaram seu primeiro livro juntos, The Holy Family or Critique of Critical Criticism. Against Bruno Bauer and Company (A sagrada família: ou a crítica da Crítica crítica: contra Bruno Bauer e consortes) além de também produziram um volumoso manuscrito não publicado – The German Ideology (A Ideologia Alemã) – que foi deixado para a “crítica corrosiva de ratos ”. No mesmo período, Engels foi à Inglaterra com seu amigo e mostrou a Marx em primeira mão o que ele havia visto e compreendido anteriormente sobre o modo de produção capitalista. Foi então que Marx desistiu da crítica à filosofia pós-hegeliana e deu início à longa jornada que conduziu, vinte anos depois, ao primeiro volume de O capital. Os dois amigos também escreveram em 1848 o Manifesto of the Communist Party (Manifesto do Partido Comunista) e participaram das atividades revolucionárias no mesmo ano.

Em 1849, após a derrota da revolução, Marx foi forçado a se mudar para a Inglaterra, e Engels logo cruzou o canal atrás dele. Marx alojou-se em Londres, enquanto Engels foi cuidar dos negócios da família em Manchester, a cerca de trezentos quilômetros de distância. Ele havia se tornado, como ele disse, o “segundo violino” para Marx, e para sustentar e ajudar seu amigo (que frequentemente estava sem renda), ele concordou em gerenciar a fábrica de seu pai em Manchester, até 1870.

As correspondências de Marx e Engels
Durante essas duas décadas, os dois homens viveram o período mais intenso de suas vidas, trocando textos sobre os principais acontecimentos políticos e econômicos da época. A maioria das 2.500 cartas trocadas datam de 1849 a 1870, período em que também enviaram cerca de 1.500 correspondências para ativistas e intelectuais em quase 20 países. A este total imponente deveriam ser acrescentadas umas boas 10.000 cartas de terceiros a Engels e Marx, e outras 6.000 que, embora não sejam mais rastreáveis, são conhecidas como tendo existido. Essa correspondência é um tesouro, contendo ideias que, em alguns casos, nem Marx nem Engels conseguiram desenvolver plenamente em seus escritos.

Poucas correspondências do século XIX podem ostentar referências tão eruditas quanto aquelas que fluíram das canetas dos dois revolucionários comunistas. Marx lia nove línguas e Engels dominava até doze. Suas cartas são impressionantes por sua constante troca de línguas e pelo número de citações eruditas, incluindo o latim e o grego. Os dois humanistas também eram grandes amantes da literatura. Marx sabia de cor passagens de Shakespeare e nunca se cansava de folhear seus volumes de Ésquilo, Dante e Balzac. Engels foi por muito tempo presidente do Instituto Schiller em Manchester e adorava Aristoteles, Goethe e Lessing. Junto com a discussão constante sobre acontecimentos internacionais e possibilidades revolucionárias, muitos de seus intercâmbios concernentes aos principais avanços contemporâneos em tecnologia, geologia, química, física, matemática e antropologia. Marx sempre considerou Engels um interlocutor indispensável, consultando seu espírito crítico sempre que precisava se posicionar sobre um assunto polêmico.

Além de grandes companheiros intelectuais, a relação sentimental entre os dois homens era ainda mais extraordinária. Marx confiou a Engels todas as suas dificuldades pessoais, a começar pelas terríveis privações materiais e os numerosos problemas de saúde que o atormentaram durante décadas. Engels demonstrou total abnegação em ajudar Marx e sua família, sempre fazendo tudo ao seu alcance para garantir-lhes uma existência digna e para facilitar a realização do O Capital. Marx sempre foi grato por essa ajuda financeira, como podemos ver pelo que ele escreveu uma noite em agosto de 1867, poucos minutos depois de ter terminado de corrigir as provas do Volume I: “Eu só devo a você que isso tenha sido possível”.

As contribuições teóricas de Engels
Durante esses 20 anos, porém, Engels nunca parou de escrever. Em 1850, ele publicou A Guerra do Camponês na Alemanha, uma história das revoltas em 1524-25. Lá, Engels procurou mostrar como o comportamento da classe média da época era semelhante ao da pequena burguesia durante a revolução de 1848-49, e quão responsável tinha sido pelas derrotas sofridas.

Para permitir que Marx dedicasse mais tempo à conclusão de seus estudos econômicos, entre 1851 e 1862, Engels também escreveu quase metade dos quinhentos artigos que Marx contribuiu para o New-York Tribune (o jornal com maior circulação nos EUA). Ele informou ao público norte-americano sobre o curso e os possíveis resultados das muitas guerras que ocorreram na Europa. Em mais de uma ocasião conseguiu antever desenvolvimentos e antecipar as estratégias militares utilizadas nas diversas frentes, ganhando para si o apelido com que era conhecido entre seus camaradas: “o General”. Sua atividade jornalística continuou por um longo tempo, e em 1870-71 ele publicou suas “Notas sobre a Guerra Franco-Prussiana”, uma série de 60 artigos para o diário inglês Pall Mall Gazette analisando os eventos militares anteriores à Comuna de Paris. Estes foram bem recebidos e testemunharam sua perspicácia em assuntos militares.

Nos quinze anos seguintes, Engels fez suas principais contribuições teóricas em uma série de escritos dirigidos contra oponentes políticos do movimento operário. Entre 1872 e 1873, ele escreveu uma série de três artigos para o Volksstaat que também foram lançados, como um panfleto, com o título The Housing Question (A questão da habitação). A intenção de Engels era se opor à disseminação das ideias de Pierre-Joseph Proudhon na Alemanha e deixar claro aos trabalhadores que as políticas reformistas não poderiam substituir uma revolução proletária. O Anti-Dühring, publicado em 1878, que ele descreveu como “uma exposição mais ou menos conectada do método dialético e da visão de mundo comunista”, tornou-se um ponto de referência crucial para a formação da doutrina marxista.

Embora os esforços de Engels para popularizar Marx – polemizando com outras leituras simplistas – devam ser distinguidos das vulgarizações da geração posterior da social-democracia alemã, seu recurso às ciências naturais abriu o caminho para uma concepção evolucionária dos fenômenos sociais que diminuiu as nuances das análises de Marx. Socialism: Utopian and Scientific (1880) (Do socialismo utópico ao cientifico), uma reformulação de três capítulos do Anti-Dühring, teve um impacto ainda maior do que o texto original. Mas, apesar de seus méritos, e do fato de ter circulado quase tão amplamente quanto o Manifesto do Partido Comunista, as definições de Engels de “ciência” e “socialismo científico” seriam posteriormente usadas pela vulgata marxista-leninista para impedir qualquer discussão crítica sobre as teses dos “fundadores do comunismo”.

A Dialética da Natureza, fragmentos de um projeto em que Engels trabalhou esporadicamente entre 1873 e 1883, tem sido objeto de grande polêmica. Para alguns, foi a pedra angular do marxismo, enquanto para outros foi o principal culpado pelo nascimento do dogmatismo soviético. Hoje deve ser lido como uma obra incompleta, revelando as limitações de Engel, mas também o potencial contido em sua crítica ecológica. Embora o uso da dialética ali certamente tenha reduzido a complexidade teórica e metodológica do pensamento de Marx, seria incorreto responsabilizá-lo –como muitos fizeram – por tudo o que acham desagradável nos escritos de Marx, ou culpar Engels somente por erros teóricos ou mesmo derrotas políticas.

Em 1884, Engels publicou Origens da Família, da Propriedade Privada e do Estado, uma análise dos estudos antropológicos realizados pelo norte-americano Lewis Morgan. Morgan havia descoberto que as relações matriarcais precediam historicamente as relações patriarcais. Para Engels, esta foi uma revelação tão importante sobre as origens da humanidade quanto “a teoria de Darwin era para a biologia e a teoria da mais-valia de Marx para a economia política”. A família já continha os antagonismos que mais tarde se desenvolveriam na sociedade e no Estado. A primeira classe de opressão a aparecer na história da humanidade “coincidiu com a opressão do sexo feminino pelo masculino”. No que diz respeito à igualdade de gênero, assim como às lutas anticoloniais, Engels nunca hesitou em defender a causa da emancipação. Finalmente, em 1886, ele publicou uma obra polêmica que visava o ressurgimento do idealismo nos círculos acadêmicos alemães, Ludwig Feuerbach e O Fim da Filosofia Alemã Clássica (1886).

Lendo Engels em 2020
Engels sobreviveu a Marx por doze anos. Durante esse tempo, ele se dedicou ao patrimônio literário de seu amigo e à liderança do movimento internacional dos trabalhadores. Sua enorme contribuição para o crescimento dos partidos operários na Alemanha, França e Grã-Bretanha é evidente em uma série de artigos jornalísticos que escreveu para os principais jornais socialistas da época, incluindo Die Neue Zeit, Le Socialiste e Critica Sociale, em saudações aos congressos do partido, bem como as centenas de cartas que escreveu neste período. Engels escreveu extensivamente sobre o nascimento e os debates em andamento a respeito da Segunda Internacional, cujo congresso de fundação ocorreu em 14 de julho de 1889. Ainda mais importante, ele dedicou suas energias à difusão do marxismo.

Engels foi encarregado da tarefa extremamente difícil de preparar para publicação os rascunhos dos Volumes II e III do Capital que Marx não conseguiu concluir. Ele também supervisionou novas edições de obras publicadas anteriormente, uma série de traduções e escreveu prefácios e posfácios para várias republicações das obras de Marx. Em uma nova introdução às Lutas de Classe na França (1850), composta alguns meses antes de sua morte, Engels elaborou uma teoria da revolução que tentou se adaptar ao novo cenário político na Europa. O proletariado tornou-se a maioria social, argumentou, e a perspectiva de tomar o poder por meios eleitorais – com sufrágio universal – tornava possível defender a revolução e a legalidade ao mesmo tempo.

Diferente dos sociais-democratas alemães, que manipulavam seu texto em um sentido legalista e reformista, Engels insistia que a “luta nas ruas” ainda tinha seu lugar na revolução. A revolução, continuou Engels, não poderia ser concebida sem a participação ativa das massas, e isso exigia “um longo e paciente trabalho”. Ler Engels hoje, 200 anos depois de seu nascimento, nos enche com o desejo de trilhar o caminho que ele abriu.

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200 anos de Engels: Sobre as contribuições e limites do “Segundo Violino”

Friedrich Engels percebeu, ainda antes do que Karl Marx, a centralidade da crítica da política económica. Quando se conheceram tinha publicado muito mais artigos – apesar de ter sido o seu amigo que se tornou famoso mundialmente nesta área.

Nascido na Alemanha há 200 anos, em 28 de novembro de 1820, em Barmen (hoje um subúrbio de Wuppertal), foi um jovem muito promissor a quem o pai, um industrial do setor têxtil, tinha negado a possibilidade de estudar na universidade, em vez disso mandnado-o para a sua empresa. Assim, Engels aprendeu por si próprio com um apetite voraz pelo conhecimento e assinava os seus artigos com um pseudónimo para evitar conflitos com a sua família conservadora e fortemente religiosa. Tornou-se ateu e os dois anos que passou em Inglaterra – para onde foi mandado com a idade de 22 anos para trabalhar em Manchester, nos escritórios da fiação de algodão Ermen & Engels – foram decisivos para a maturação das suas convicções políticas. Foi então que observou na primeira pessoa os efeitos da exploração capitalista no proletariado, da propriedade privada e da competição entre indivíduos. Contactou com o movimento cartista e apaixonou-se por uma trabalhadora irlandesa, Mary Burns, que desempenhou um papel central no seu desenvolvimento.

Jornalista brilhante, publicou na Alemanha descrições das lutas sociais inglesas e escreveu na imprensa anglófona sobre os avanços sociais em curso no continente. O artigo “Esboços de uma Crítica da Economia Política”, publicado nos Anais Franco-Alemães em 1844, suscitou grande interesse em Marx, que na altura tinha decidido consagrar todas as suas energias ao mesmo tema. Os dois iniciaram então uma colaboração teórica e política que duraria para o resto das suas vidas.

Em 1845, Engels publicou em Alemão o seu primeiro livro, A Condição da Classe Trabalhadora na Inglaterra. O subtítulo enfatizava que era baseado “na observação direta e em fontes genuínas” e escreveu no prefácio que o conhecimento real das condições de vida e de trabalho dos proletários era “absolutamente necessário para se conseguir uma base sólida para as teorias socialistas”. O livro haveria de ter sequelas em muitas investigações posteriores. Uma dedicatória de abertura, “à classe trabalhadora da Inglaterra”, salientava ainda mais que o seu trabalho “de campo” lhe tinha dado um “conhecimento das vidas reais dos trabalhadores” direto e não abstrato. Nunca foi discriminado ou “tratado por eles como um estrangeiro” e estava feliz por ver que eles estam libertos da “terrível maldição da estreiteza nacional e da arrogância nacional”.

No mesmo ano, quando o governo francês expulsou Marx devido às suas atividades comunistas, Engels seguiu-o até Bruxelas. Publicaram A Sagrada Família, ou a Crítica do criticismo crítico: Contra Bruno Bauer e Companhia (o seu primeiro livro conjunto com Marx) e os dois produziram um volumoso manuscrito não publicado – A Ideologia Alemã – que foi abandonado à “crítica corrosiva dos ratos”. Neste período, Engels foi para Inglaterra com o seu amigo e isso permitiu mostrar-lhe o que tinha já visto e compreendido sobre o modo capitalista de produção. Marx finalmente abandonou a crítica da filosofia pós-hegeliana e começou a longa jornada que conduziu, vinte anos mais tarde, ao primeiro volume do Capital. Então, os dois amigos escreveram o Manifesto do Partido Comunista (1848) e participaram nas revoluções de 1848.

Em 1849, na sequência da derrota da revolução, Marx foi forçado a ir para Inglaterra e Engels depressa cruzou o canal para se lhe juntar. Marx alojou-se Londres, enquanto que o amigo foi tomar conta do negócio de família em Manchester a uns 300 quilómetros de distância. Tornou-se o “segundo violino”, nas suas palavras, para se sustentar e ajudar o seu amigo (que ficava frequentemente sem rendimento), aceitando gerir a fábrica do seu pai em Manchester até 1870.

Durante estas duas décadas, depois das quais Engels abandonou o negócio e conseguiu finalmente voltar a juntar-se ao seu amigo na capital inglesa, os dois homens viveram o período mais intenso das suas vidas, comparando, várias vezes por semana, notas sobre os principais acontecimentos políticos e económicos da altura. A maior parte das 2.500 cartas que trocaram são datas destas duas décadas, durante as quais também enviaram 1.500 peças de correspondência a ativistas e intelectuais de cerca de vinte países. A este impressionante total devem ser somadas umas boas 10.000 cartas para Engels e Marx de terceiros e outras 6.000, as quais, apesar de se lhes termos perdido o rasto, temos a certeza de terem existido. É um tesouro inestimável, contendo ideias que, em alguns casos, acabaram por não desenvolver cabalmente nos seus escritos.

Poucas correspondências do século XIX conseguem ostentar referências tão eruditas quanto as que fluíram das canetas dos dois revolucionários comunistas. Marx lia nove línguas e Engels dominava doze. As suas cartas são notáveis pelas suas constantes mudanças de línguas e pelo número de citações, incluindo em latim e grego antigo. Os dois humanistas eram também grandes amantes de literatura. Marx conhecia passagens de Shakespeare de cor e nunca se cansava de folhear os seus volumes de Ésquilo, Dante e Balzac. Engels foi durante muito tempo o presidente do Instituto Schiller de Manchester e adorava Aristóteles, Goethe e Lessing. Junto com as constantes discussões sobre acontecimentos internacionais e possibilidades revolucionárias, muitas das suas trocas de correspondência diziam respeito aos avanços mais importantes na tecnologia, geologia, química, física, matemática e antropologia. Marx considerou sempre Engels um interlocutor indispensável, consultando a sua voz crítica sempre que tinha de tomar posição sobre um tema controverso.

A relação entre os dois homens era ainda mais extraordinária em termos humanos do que ao nível intelectual. Marx confidenciava todas as suas dificuldades pessoais a Engels, começando pelas suas terríveis dificuldades materiais e os inúmeros problemas de saúde que o atormentaram durante décadas. Engels mostrou total auto-abnegação ao ajudar Marx e a sua família, fazendo sempre tudo o que podia para assegurar-lhes uma existência digna e facilitar a finalização do Capital. Marx ficou para sempre grato pela sua assistência financeira, como podemos ver no que escreveu numa noite de agosto de 1867, poucos minutos depois de ter acabado de corrigir as provas do Volume Um: “Devo-te apenas a ti que isto tenha sido possível.”

Até durante esses vinte anos, nunca deixou de escrever. Em 1850 publicou A Guerra Camponesa na Alemanha, uma história das revoltas de 1524-25, na qual tentava mostrar o quão similar tinha sido o comportamento da classe média relativamente ao da pequena-burguesia durante a revolução de 1848-49 e quão responsável tinha sido pelas derrotas que se lhe seguiram. De forma a permitir que o seu amigo dedicasse mais tempo à finalização dos seus estudos de economia, entre 1851 e 1862 também escreveu quase metade das cinco centenas de artigos que Marx assinou no New-York Tribune (o jornal com maior circulação nos Estados Unidos). Fez reportagens para o público americano sobre o curso e resultados possíveis de muitas das guerras que ocorriam na Europa. Não raramente provou ser capaz de prever desenvolvimentos e antecipar estratégias militares utilizadas em várias frentes, ganhando a alcunha pela qual era conhecido pelos seus camaradas: “o General”. A sua atividade jornalística continuou durante muito tempo e, em 1870-71, publicou as suas Notas sobre a Guerra Franco-Prussiana, uma série de 60 artigos escritos para o diário anglófono Pall Mall Gazette em que analisava os eventos que precederam a Comuna de Paris. Estas foram bastante apreciadas e testemunharam a sua perspicácia nestas matérias.

Ao longo dos 15 anos seguintes, Engels elaborou as suas contribuições teóricas principais numa série de artigos ocasionais que se opunham às posições de adversários políticos dentro do movimento dos trabalhadores e procuravam clarificar temas controversos. Entre 1872 e 1873 escreveu uma série de três artigos para o Volksstaat que também saíram, como um panfleto, com o título A Questão da Habitação. A intenção de Engels era opor-se à disseminação das ideias de Pierre-Joseph Proudhon na Alemanha e tornar claro para os trabalhadores de que a política de reformas não poderia substituir a revolução proletária. O Anti-Dühring, publicado em 1878, que descreveu como “uma exposição mais ou menos alinhavada do método dialético e das perspetiva comunista do mundo”, tornou-se uma referência crucial para a formação da doutrina marxista. Apesar de termos de distinguir entre os trabalhos de popularização empreendidos por Engels, em polémica aberta contra os atalhos simplistas do seu tempo, e a vulgarização levada a cabo pela geração seguinte da Social-Democracia Alemã, o seu recurso às ciências naturais abriu caminho a uma conceção evolucionária dos fenómenos sociais que diminuía as análises muito mais matizadas de Marx. Socialismo: Utópico e Científico (1880), um retomar de três capítulos do Anti-Dühring para efeitos pedagógicos, teve um impacto ainda maior do que o texto original. Mas, apesar dos seus méritos e do facto de terem circulado quase tão amplamente como o Manifesto do Partido Comunista, as definições de “ciência” e de “socialismo científico” podem ser vistas como um exemplo do autoritarismo epistemológico subsequentemente usado pela vulgata marxista-leninista para eludir qualquer discussão crítica das teses dos “fundadores do comunismo”. A Dialética da Natureza, fragmentos de um projeto no qual Engels trabalhou com muitas interrupções entre 1873 e1883, tem sido objeto de enorme controvérsia. Para alguns era a pedra angular do Marxismo, para outros o principal culpado do nascimento do dogmatismo Soviético. Hoje em dia deve ser lido como um trabalho incompleto, que mostra as limitações de Engels, mas também o potencial contido na sua crítica ecológica. Apesar do seu uso da dialética ter certamente reduzido a complexidade teórica e metodológica de pensamento de Marx, não é correto – como alguns fizeram maldosa e superficialmente no passado – responsabilizá-lo por tudo o que não gostam nos escritos de Marx e culpar apenas Engels pelos erros teóricos ou até pelas derrotas práticas.

Em 1844, Engels publicou as Origens da Família, da Propriedade Privada e do Estado, uma análise dos estudos antropológicos conduzidos pelo americano Lewis Morgan, que tinha descoberto que as relações matriarcais precederam historicamente as relações patriarcais. Para Engels, esta era uma revelação tão importante acerca das origens da humanidade quanto “a teoria de Darwin [foi] para a biologia e a teoria de Marx para a economia política”. A família continha já os antagonismos que mais tarde seriam desenvolvidos na sociedade e no Estado. O primeiro tipo de opressão a surgir na história humana “coincidiu com a opressão do sexo feminino pelo masculino”. No que diz respeito à igualdade de género, tal como no caso das lutas anticoloniais, nunca hesitou em defender – e em expor com convicção – a causa da emancipação. Finamente, em 1886, também lançou um trabalho polémico cujo alvo era o ressurgimento do idealismo nos círculos académicos alemães, Ludwig Feuerbach e o Fim da Filosofia Clássica Alemã (1886).

Durante os doze anos em que sobreviveu a Marx, dedicou-se ao legado literário do amigo e à liderança do movimento internacional de trabalhadores. Uma série de peças jornalísticas nos principais jornais socialistas do seu tempo, incluindo a Die Neue Zeit, Le Socialiste e a Critica Sociale, as saudações a congressos partidários, assim como as centenas de cartas que ele escreveu nesse período possibilitam que apreciemos de forma mais profunda a sua contribuição para o crescimento dos partidos operários na Alemanha, França e Grã-Bretanha, numa série de assuntos organizativos e teóricos. Alguns destes dizem respeito ao nascimento da Segunda Internacional, cujo congresso de fundação teve lugar a 14 de julho de 1889, e a muitos dos seus debates. Ainda mais importante, consagrou as suas melhores energias à difusão do marxismo. Sobretudo, assumiu a tarefa extremamente difícil de preparar para publicação os esboços dos Volumes Dois e Três do Capital que Marx não tinha conseguido completar. Também supervisionou as novas edições de trabalhos previamente publicados, uma série de traduções, e escreveu prefácios e posfácios para várias republicações de trabalhos de Marx e seus. Numa delas, uma nova introdução à Luta de Classes em França de Marx (1850), composta alguns meses antes da sua morte, Engels elaborou uma teoria da revolução que se tentava adaptar à nova conjuntura política da Europa. O proletariado tinha-se tornado a maioria, defendia, e a possibilidade de tomada de poder por meios eleitorais, através do sufrágio universal, tornava possível defender a revolução e a legalidade ao mesmo tempo. Isto não significava, contudo – como os Social-Democratas alemães sugeriam, ao manipular o seu texto num sentido reformista e legalista – que a “luta nas ruas” tivesse deixado de ter qualquer função. Significava que a revolução não podia ser concebida sem a participação das massas e que isto requeria “um longo e paciente trabalho”. Ler Engels hoje, com o desabar à nossa vista do capitalismo contemporâneo, alimenta o desejo de continuar a lutar seguindo o seu caminho.

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Recordando a Engels

Friedrich Engels escribió una vez que era el “segundo violín” de Marx. En el 200° aniversario de su nacimiento, debemos recordar la enorme influencia que tuvo sobre el pensamiento de su amigo y camarada, como así también sus propias contribuciones teóricas.

Friedrich Engels entendió aun antes que Marx la centralidad que tenía la crítica de la economía política. De hecho, cuando estos dos pensadores radicales empezaban a conocerse, Engels ya había publicado muchos más artículos sobre el tema que su amigo.

Engels nació hace 200 años, el 28 de noviembre de 1820, en Barmen, hoy un suburbio de Wuppertal (Alemania). Friedrich Engels fue un joven prometedor al que su padre, un industrial textil, le impidió asistir a la universidad, instándolo a trabajar en su empresa privada. Engels, un ateo convencido, era autodidacta y tenía un apetito voraz por el conocimiento. Firmaba sus artículos con un seudónimo para evitar el conflicto con su familia, que era profundamente conservadora y religiosa.

Los dos años que pasó en Inglaterra –adonde fue enviado con solo 22 años para trabajar en Manchester, en las oficinas de la fábrica de algodón Ermen & Engels– fueron decisivos para la maduración de sus ideas políticas. Fue allí donde pudo ver en persona los efectos que tenían la explotación capitalista del proletariado, la propiedad privada y la competencia entre individuos. Estableció contacto con el cartismo y se enamoró de una obrera irlandesa, Mary Burns, quien jugó un rol clave en su obra y en su vida. Periodista brillante, publicó en Alemania informes sobre las luchas sociales inglesas y escribió en la prensa anglófona sobre los avances sociales que se desarrollaban en el continente. El artículo “Apuntes para una crítica de la economía política”, publicado en los Anuarios francoalemanes de 1844, despertó un enorme interés en Marx, quien en ese momento había decidido concentrar todas sus energías en el mismo tema. Iniciaron así una colaboración teórica y política que duraría el resto de sus vidas.

La influencia de Engels

En 1845, Engels publicó su primer libro en alemán: La situación de la clase obrera en Inglaterra. Tal como enfatiza el subtítulo, esta obra está basada en la observación directa y en fuentes genuinas, y Engels escribió en el prefacio que el verdadero conocimiento de las condiciones de vida y de trabajo del proletariado era absolutamente necesario para brindarle un fundamento sólido a las teorías socialistas. En la dedicatoria de su introducción, “A la clase obrera de Inglaterra”, Engels insiste en que su trabajo “de campo” le dio un conocimiento directo, no abstracto, de las condiciones de vida reales de los trabajadores. Dice que nunca lo discriminaron ni lo trataron como a un extraño, y que estaba contento de ver que la clase obrera carecía de la terrible maldición de la estrechez y la arrogancia nacionales.
El año en el que el gobierno francés expulsó a Marx por sus actividades comunistas, Engels lo acompañó a Bruselas. Publicaron entonces La Sagrada Familia, o crítica de la crítica crítica:
 contra Bruno Bauer y consortes –su primer obra conjunta– y produjeron también un voluminoso manuscrito que no publicaron –La ideología alemana–, abandonado a la inmisericorde “crítica de las ratas”. Durante el mismo período, Engels viajó a Inglaterra con su amigo y le mostró de primera mano todo lo que había visto y comprendido sobre el modo de producción capitalista. Fue entonces cuando Marx abandonó la crítica de la filosofía pos-Hegeliana y dio inicio al largo camino que lo llevó, veinte años después, a escribir el primer volumen de El capital. Los dos amigos también escribieron el Manifiesto del Partido Comunista (1848) y participaron de las revoluciones de 1848.

En 1849, luego de la derrota de la revolución, Marx se vio forzado a mudarse a Inglaterra, y Engels cruzó rápidamente el canal siguiendo a su amigo. Marx se alojó en Londres, mientras que Engels se instaló a gestionar el negocio familiar en Manchester, a unos trescientos kilómetros de distancia. Se había convertido, en sus propias palabras, en el “segundo violín” de Marx, y para mantenerse a sí mismo y ayudar a su amigo –quien a menudo no tenía ningún ingreso– aceptó gestionar la fábrica de su padre en Manchester hasta 1870.

La correspondencia entre Marx y Engels

Durante estas dos décadas, los dos hombres vivieron el período más intenso de sus vidas, compartiendo muchos artículos por semana que trataban sobre los acontecimientos políticos y económicos de la época. La mayoría de las 2500 cartas que intercambiaron están fechadas entre 1849 y 1870, período durante el cual también hicieron más de 1500 envíos por correspondencia a activistas e intelectuales de casi veinte países. A este total imponente deberían agregarse otras 10 000 cartas dirigidas a Engels y Marx de parte de terceros, y otras 6000 que, a pesar de no ser localizables, se sabe con certeza que existieron. Esta correspondencia es un tesoro que, en algunos casos, contiene ideas que ni Marx ni Engels pudieron desarrollar con éxito en sus escritos.
Pocas correspondencias del siglo diecinueve pueden presumir de tener referencias tan eruditas como las que salieron de las plumas de estos dos comunistas revolucionarios. Marx leía nueve idiomas y Engels dominaba doce. Sus cartas son impactantes por sus cambios constantes entre idiomas distintos y por el número de citas que sabían de memoria, muchas en latín y griego antiguos. Estos dos humanistas eran también grandes amantes de la literatura. Marx sabía de memoria muchos pasajes de Shakespeare y nunca se cansó de hojear sus volúmenes de Esquilo, Dante y Balzac. Engels fue presidente del Instituto Schiller en Manchester durante mucho tiempo y adoraba a Aristóteles, Goethe y Lessing. Además de las discusiones permanentes sobre los acontecimientos internacionales y las posibilidades revolucionarias que se abrían, sus intercambios trataban también sobre los grandes avances de la tecnología, la geología, la química, la física, las matemáticas y la antropología. Marx siempre consideró a Engels como un interlocutor indispensable, apelando a su mirada crítica cada vez que tenía que tomar posición sobre algún tema controversial.

A pesar de ser grandes compañeros intelectuales, la relación sentimental entre estos dos hombres fue mucho más lejos. Marx le confiaba todas sus dificultades personales a Engels, empezando por sus terribles padecimientos materiales y los numerosos problemas de salud que lo atormentaron durante décadas. Engels mostraba una abnegación total a la hora de ayudar a Marx y a su familia, haciendo siempre todo lo que estaba su alcanza para asegurarles una existencia digna y para facilitar la finalización de El capital. Marx estuvo siempre agradecido por esta asistencia financiera, como podemos ver en la carta que le escribió una noche de agosto de 1867, tan solo algunos minutos después de terminar de corregir el borrador del volumen uno: “Solo a ti te debo que esto haya sido posible”.

La contribución teórica de Engels

Sin embargo, Engels nunca dejó de escribir, ni siquiera durante esos veinte años. En 1850 publicó Las guerras campesinas en Alemania, una historia de las revueltas de 1524-1525. En esta obra, Engels intentó mostrar cuan similares eran las conductas de la clase media del momento a las de la pequeña burguesía durante la revolución de 1848-1849, y cuan responsable había sido por las derrotas sufridas. Para permitir que Marx le dedicara más tiempo a la finalización de sus estudios económicos, entre 1851 y 1862 Engels también escribió casi la mitad de los quinientos artículos que Marx envió al New-York Tribune (el diario de mayor circulación en Estados Unidos). Informó al público americano acerca del curso y de los posibles desenlaces de muchas de las guerras que se desarrollaban en Europa. En más de una ocasión logró prever el desarrollo de los acontecimientos y anticipar las estrategias militares utilizadas en distintos frentes, ganándose el sobrenombre por el cual era reconocido entre sus camaradas: “el general”. Su actividad periodística continuó durante un largo período, y en 1870-1871 publicó sus Notas sobre la guerra francoalemana, una serie de sesenta artículos para el diario inglés Pall Mall Gazette en los que analizaba los acontecimientos militares que precedieron a la Comuna de París. Estos fueron muy bien recibidos y daban testimonio de su perspicacia en asuntos militares.
Durante los próximos quince años, Engels realizó sus principales contribuciones teóricas en una serie de escritos dirigidos contra sus oponentes políticos en el movimiento obrero. Entre 1872 y 1873 escribió una serie de tres artículos para el Volksstaat que también fueron publicados, en forma de panfleto, bajo el título La cuestión de la vivienda. La intención de Engels era oponerse a la difusión de las ideas de Pierre-Joseph Proudhon en Alemania y dejar claro para los trabajadores que las políticas reformistas no podían reemplazar una revolución proletaria. El Anti-Dühring, publicado en 1878, descripto por Engels como una exposición más o menos coherente del método dialéctico y del enfoque comunista, se convirtió en un punto de referencia clave para la formación de la doctrina marxista.

A pesar de que los esfuerzos de Engels para popularizar a Marx –polemizando con otras lecturas simplistas– deben ser distinguidos de las vulgarizaciones realizadas por la siguiente generación de la socialdemocracia alemana, su apoyo en las ciencias naturales efectivamente abrió el camino a una concepción evolucionista de los fenómenos sociales que debilitó los análisis más matizados de Marx. Del socialismo Utópico al socialismo científico (1880), una reelaboración de tres capítulos del Anti-Dühring, tuvo mucho más impacto que el texto original. Pero más allá de sus méritos, y de que circuló casi tan ampliamente como el Manifiesto del Partido Comunista, lo cierto es que las definiciones de Engels de la “ciencia” y del “socialismo científico” serían utilizadas posteriormente por la vulgata marxista-leninista para impedir cualquier discusión crítica de las tesis de los “fundadores del comunismo”.

Los fragmentos de un proyecto en el cual Engels trabajó esporádicamente entre 1873 y 1883, publicados bajo el título Dialéctica de la naturaleza, han sido objeto de una gran controversia. Para algunas personas, esta obra es la piedra de toque del marxismo, mientras que para otras es la principal causa del nacimiento del dogmatismo soviético. En la actualidad debe ser leída como una obra incompleta, que muestra los límites de Engels pero también el potencial contenido de su crítica ecológica. Mientras que su uso de la dialéctica ciertamente reduce la complejidad teórica y metodológica del pensamiento de Marx, sería incorrecto buscar en Engels –como hizo mucha gente– las causas de todo lo que no nos agrada en los escritos de Marx, o culpar exclusivamente a Engels por los errores teóricos e incluso por las derrotas políticas.

En 1884, Engels publicó El origen de la familia, la propiedad privada y el Estado, un análisis de los estudios antropológicos dirigidos por el norteamericano Lewis Morgan. Morgan había descubierto que las relaciones matriarcales precedían históricamente a las relaciones patriarcales. Para Engels, se trataba de una revelación importante acerca de los orígenes de la humanidad equivalente a lo que fue “la teoría de la evolución de Darwin para la biología y […] la teoría de la plusvalía, enunciada por Marx, para la economía política”. La familia contenía en sí misma los antagonismos que más tarde se desarrollarían en la sociedad y en el Estado. La primera opresión de clase que apareció en la historia humana coincide “con la del sexo femenino por el masculino”. En relación con la igualdad de género, como así también con las luchas anticoloniales, Engels nunca dudó en defender la causa de la emancipación. Finalmente, en 1886, publicó una obra polémica que apuntaba contra la resurgencia del idealismo entre los círculos académicos alemanes, Ludwig Feuerbach y el fin de la filosofía clásica alemana (1886).

Leer a Engels en 2020

Engels vivió doce años más que Marx. Durante ese tiempo se dedicó al legado intelectual de su amigo y a la dirección del movimiento obrero internacional. Su enorme contribución al crecimiento de los partidos obreros en Alemania, Francia e Inglaterra se hace evidente en un número de artículos periodísticos escritos para los periódicos más importantes de aquel momento, incluyendo a Die Neue Zeit, Le Socialiste, y Critica Sociale, en los saludos a los congresos partidarios, como así también en las cientos de cartas que escribió durante el período. Engels escribió mucho sobre el surgimiento y los debates de la Segunda Internacional, cuyo congreso fundacional se celebró el 14 de julio de 1889. Todavía más importante fue la energía que dedicó a la popularización del marxismo.
Engels se encargó de la difícil tarea de preparar para su publicación los borradores de los volúmenes segundo y tercero de El capital, que Marx no había logrado terminar en vida. También supervisó las nuevas ediciones de algunas obras que habían sido publicadas antes, algunas traducciones, y escribió prefacios y posfacios para varias republicaciones de las obras de Marx. En una introducción a La lucha de clases en Francia (1850), escrita algunos meses antes de su muerte, Engels elaboró una teoría de la revolución que intentó adaptar a la nueva escena política europea. El proletariado se había convertido en la mayoría social, argumentaba, y las posibilidades de tomar el poder utilizando medios electorales –es decir, a través del sufragio universal– hacían que fuera posible defender la revolución y la legalidad al mismo tiempo.

A diferencia de la socialdemocracia alemana, que manipuló este texto para darle un sentido legalista y reformista, Engels insistía en que la “lucha en las calles” todavía jugaría un rol importante en la revolución. La revolución, continuaba, no podría ser concebida sin la participación activa de las masas, y esto requería un “trabajo largo y paciente”. Leer a Engels hoy, a 200 años de su nacimiento, nos llena con el deseo renovado de aventurarnos por el camino que él trazó.

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Friedrich Engels Was More Than Second Fiddle to Karl Marx

Friedrich Engels once wrote that he played “second fiddle” to Marx. On the 200th anniversary of his birth, we should remember the profound influence that Engels had on his friend and comrade, as well as his own theoretical contributions.

Friedrich Engels understood even earlier than Karl Marx the centrality of the critique of political economy. In fact, at the time the two radicals were first getting to know one another, Engels had published many more articles on the topic than his friend.

Born two hundred years ago, on November 28, 1820, in Barmen, Germany (today a suburb of Wuppertal), Friedrich Engels was a promising young man whose father, a textile industrialist, had denied him a chance to study at university and instead guided him into his private firm. Engels, an atheist, was self-taught and had a voracious appetite for knowledge. He signed his pieces with a pseudonym to avoid conflict with his conservative, strongly religious family.

The two years he spent in England — where he was sent at the age of twenty-two to work in Manchester, at the offices of the Ermen & Engels cotton mill — were decisive for the maturation of his political convictions. It was there that he personally observed the effects of capitalist exploitation of the proletariat, private property, and competition between individuals. He made contact with the Chartist movement and fell in love with an Irish working woman, Mary Burns, who played a key role in his development.

A brilliant journalist, he published accounts in Germany on English social struggles and wrote for the English-speaking press about the social advances underway on the continent. His Outlines of a Critique of Political Economy, published in the Deutsch–Französische Jahrbücher in 1844, aroused great interest in Marx, who at the time had decided to devote all his energies to the same subject. The two began a theoretical and political collaboration that would last for the rest of their lives.

Engels’s Influence

In 1845, Engels published his first book in German, The Condition of the Working Class in England. As its subtitle emphasized, this work was based “on direct observation and genuine sources”: Engels wrote in the preface that real knowledge of proletarian working and living conditions was “absolutely necessary to be able to provide solid ground for socialist theories.” In his introductory dedication, “To the Working Class of England,” Engels further pointed out that his work “in the field” had given him direct, not abstract, “knowledge of the workers’ real lives.” He had never been discriminated against or “treated by them as a foreigner,” and he was happy to see that they were free of the “terrible curse of national narrowness and national arrogance.”

In the same year that the French government expelled Marx because of his communist activities, Engels followed him to Brussels. There, they published The Holy Family, or the Critique of Critical Criticism: Against Bruno Bauer and Company (his first joint book with Marx). The two also produced a voluminous manuscript — The German Ideology — though this was unpublished and thus left to the “gnawing criticism of mice.” In the same period, Engels went to England with his friend and showed Marx firsthand what he had earlier seen and understood about the capitalist mode of production. It was then that Marx gave up the critique of post-Hegelian philosophy and began the long journey that led, twenty years later, to the first volume of Capital. The two friends also wrote the Manifesto of the Communist Party (1848) and participated in the revolutions of 1848.

In 1849, following the defeat of the revolution, Marx was forced to move to England, and Engels soon crossed the Channel after him. Marx took up lodgings in London, while Engels went to manage the family business in Manchester, some two hundred miles away. He had become, as he put it, the “second fiddle” to Marx, and in order to support himself and to help his friend (who was often without an income) he agreed to manage his father’s factory in Manchester, until 1870.

The Marx-Engels Correspondence

During these two decades, the two men lived the most intense period of their lives, comparing notes several times a week on the main political and economic events of the age. Most of the 2,500 letters they exchanged date from between 1849 and 1870, during which period they also sent some 1,500 items of correspondence to activists and intellectuals in nearly twenty countries. To this imposing total should be added a good ten thousand letters to Engels and Marx from third parties, and another six thousand which, though no longer traceable, are known with certainty to have existed. This correspondence is a treasure, containing ideas which, in some cases, neither Marx nor Engels succeeded in fully developing in their writings.

Few nineteenth-century correspondences can boast references as erudite as those that flowed from the pens of the two communist revolutionaries. Marx read nine languages, and Engels mastered as many as twelve. Their letters are striking for their constant switching between languages and for their number of learned quotations, including ancient Latin and Greek. The two humanists were also great lovers of literature. Marx knew passages from Shakespeare by heart and never tired of leafing through his volumes of Aeschylus, Dante, and Balzac. Engels was long president of the Schiller Institute in Manchester and worshipped Aristotle, Goethe, and Lessing. Along with constant discussion of international events and revolutionary possibilities, many of their exchanges concerned the major contemporary advances in technology, geology, chemistry, physics, mathematics, and anthropology. Marx always considered Engels an indispensable interlocutor, consulting his critical mind whenever he had to take a position on a controversial matter.

While great intellectual companions, the sentimental relationship between the two men was even more extraordinary. Marx confided all his personal difficulties to Engels, beginning with his terrible material hardship and the numerous health problems that tormented him for decades. Engels showed total self-abnegation in helping Marx and his family, always doing everything in his power to ensure them a dignified existence and to facilitate the completion of Capital. Marx was ever grateful for this financial assistance, as we can see from what he wrote one night in August 1867, a few minutes after he had finished correcting the proofs of Volume I: “I owe it to you alone that this was possible.”

Engels’s Theoretical Contribution

Even during those twenty years, however, Engels never ceased to write. In 1850 he published The Peasant War in Germany, a history of the revolts in 1524–25. There, Engels sought to show how similar the middle-class behavior at the time was to that of the petty bourgeoisie during the revolution of 1848–49, and how responsible it had been for the defeats incurred. In order to allow Marx to devote more time to the completion of his economic studies, between 1851 and 1862 Engels also wrote nearly half of the five hundred articles that Marx contributed to the New-York Tribune (the paper with the largest circulation in the United States). He reported to the American public on the course and possible outcomes of the many wars that took place in Europe. On more than one occasion he managed to foresee developments and to anticipate the military strategies used on various fronts, earning for himself the sobriquet by which he was known to all his comrades: “The General.” His journalistic activity continued for a long time, and in 1870–71, while he was also very active in the International Working Men’s Association, he published his Notes on the Franco-Prussian War, a series of sixty articles for the English daily Pall Mall Gazette analyzing the military events preceding the Paris Commune. These were well-received and testified to his insight into military matters.

Over the next fifteen years, Engels made his principal theoretical contributions in a series of writings directed against political opponents in the workers’ movement. Between 1872 and 1873 he wrote a series of three articles for the Volksstaat that were also released, as a pamphlet, with the title The Housing Question. Engels’s intention was to oppose the spread of Pierre-Joseph Proudhon’s ideas in Germany and to make clear to workers that reformist policies could not replace a proletarian revolution. The Anti-Dühring, published in 1878, which he described as “a more or less connected exposition of the dialectical method and the communist world outlook,” became a crucial point of reference for the formation of Marxist doctrine.

Although Engels’s efforts to popularize Marx — polemicizing with other simplistic readings — should be distinguished from the vulgarizations of the later generation of German Social Democracy, his recourse to the natural sciences did open the way to an evolutionary conception of social phenomena that diminished Marx’s more nuanced analyses. Socialism: Utopian and Scientific (1880), a reworking of three chapters of Anti-Dühring, had an even greater impact than the original text. But despite its merits, and the fact that it circulated almost as widely as the Manifesto of the Communist Party, Engels’s definitions of “science” and “scientific socialism” would later be used by the Marxist-Leninist vulgate to preclude any critical discussion of the theses of the “founders of communism.”

The Dialectics of Nature, fragments of a project on which Engels worked sporadically between 1873 and 1883, has been the object of huge controversy. For some it was the cornerstone of Marxism, while for others the main culprit in the birth of Soviet dogmatism. Today it should be read as an incomplete work, revealing Engels’s limitations but also the potential contained in his ecological critique. While his use of dialectics there certainly reduced the theoretical and methodological complexity of Marx’s thought, it would be incorrect to hold it responsible — as many have done — for everything they find disagreeable in Marx’s writings, or to blame Engels alone for theoretical errors or even political defeats.

In 1884, Engels published Origins of the Family, Private Property and the State, an analysis of the anthropological studies conducted by the American Lewis Morgan. Morgan had discovered that matriarchal relations historically preceded patriarchal relations. For Engels, this was as important a revelation concerning the origins of humanity as “Darwin’s theory [was] for biology and Marx’s theory of surplus-value for political economy.” The family already contained the antagonisms that would later be developed in society and the state. The first class oppression to appear in human history “coincided with the oppression of the female sex by the male.” With regard to gender equality, as well as anticolonial struggles, Engels never hesitated to uphold the cause of emancipation. Finally, in 1886, he published a polemical work that took aim at the resurgence of idealism in German academic circles, Ludwig Feuerbach and the End of Classical German Philosophy (1886).

Reading Engels in 2020

Engels outlived Marx by twelve years. During that time, he devoted himself to his friend’s literary estate and to the leadership of the international workers’ movement. His enormous contribution to the growth of workers’ parties in Germany, France, and Britain is evident in a number of journalistic pieces for the major socialist papers of the time, including Die Neue Zeit, Le Socialiste, and Critica Sociale, in greetings to party congresses, as well as the hundreds of letters that he wrote in this period. Engels wrote extensively on the birth and ongoing debates concerning the Second International, whose founding congress took place on July 14, 1889. Even more important, he devoted his energies to the spread of Marxism.

Engels was charged with the extremely difficult task of preparing for publication the drafts of Volumes Two and Three of Capital that Marx had not managed to complete. He also oversaw new editions of previously published works, a number of translations, and wrote prefaces and afterwords to various republications of Marx’s works. In a new introduction to Marx’s Class Struggles in France (1850), composed a few months before his death, Engels elaborated a theory of revolution that tried to adapt to the new political scene in Europe. The proletariat had become the social majority, he argued, and the prospect of taking power through electoral means — with universal suffrage — made it possible to defend revolution and legality at the same time.

Different from the German Social Democrats, who manipulated his text in a legalistic, reformist sense, Engels insisted that the “fight on the streets” still had its place in the revolution. The revolution, Engels continued, could not be conceived without the active participation of the masses, and this required “long and patient work.” Reading Engels today, two hundred years on from his birth, fills us with a new desire to strike out along the path he blazed.

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Engels, una propuesta de emancipación (Talk)

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Past talks

Roundtable at the Conference “Engels 200. Dialéctica y Revolución”.

Engels, la crítica y lo político
Martín Mazora. UNSAM – Argentina
Ana Miranda. FFyL UNAM
Gerardo Ambriz. UMSNH-México

Dialéctica, ciencia y naturaleza
Eva Jablonka. TAU, Israel
Diego Mendez. UAM, C

Engels, una propuesta de emancipación
Alejandra Criza. UNCUYO
María Lygia Quartim de Moraes. UNICAMP
David Pavón Cuellas. México

Engels 2020: Dialéctica y revolución
Marcello Musto. York University
Elivera Concheiro borquez. CEIICH-UNAM
José G. Gandarilla Salgado. CEIICH-UNAM
María Haydée Garcia Bravo. CEIICH-UNAM

Organiza
Universidad Nacional Autónoma de México
Centro de investigaciones Interdisciplinarias en Ciencias y Humanidades

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Giuseppe Costigliola, PULP Libri. Quotidiano dei libri

Marx, oggi. Un pensiero con sette vite come le talpe

Quante volte abbiamo sentito affermare da autorevoli studiosi, analisti politici, economisti, giornalisti e quant’altro che Karl Marx e il suo pensiero sono da relegare in soffitta?

Che le sue teorie sociali, politiche ed economiche, il suo sistema di analisi del capitalismo sono ormai inadeguati a descrivere la contemporaneità e l’era della globalizzazione? Innumerevoli volte, da almeno un quarantennio, la demolizione sistematica delle teorie marxiste è avanzata con un fuoco incrociato di TV, giornali, dipartimenti universitari, riviste scientifiche, un compiaciuto coro funebre troppo coordinato per non riuscire sospetto.

Da un decennio a questa parte, però, in seguito alla gigantesca crisi economica del 2008 nella quale siamo ancora invischiati, e in particolare nel biennio 2017-18, attraverso le iniziative organizzate per tutto il globo in occasione del 150° anniversario della pubblicazione de Il Capitale e del bicentenario della nascita, Marx sembra tornato alla ribalta. Anche grazie a manoscritti sconosciuti e testi inediti, si è avuto un rifiorire degli studi a lui dedicati, sono apparse interpretazioni innovative del suo imponente lascito che hanno aperto la via a nuovi orizzonti di ricerca, e si è scoperto che il pensiero marxiano risulta ancora indispensabile per comprendere le contraddizioni del capitalismo, i suoi meccanismi distruttivi dell’uomo e dell’ambiente.

Sull’onda di questo rinnovato interesse, l’editore Donzelli ha pubblicato un volume, Marx revival. Concetti essenziali e nuove letture, curato da uno dei maggiori studiosi italiani della materia, Marcello Musto. Diviso in capitoli che analizzano 22 concetti fondamentali (capitalismo, comunismo, democrazia, rivoluzione, ecologia, globalizzazione, e così via), il libro raccoglie i contributi di prestigiosi studiosi internazionali, con il duplice intento di una ridiscussione critica e innovativa dei temi classici della riflessione di Marx, e l’analisi di alcune tematiche non ancora accostate al suo pensiero. Il risultato è una panoramica ad amplissimo raggio, capace di suscitare la curiosità di chiunque sia interessato alla storia della cultura, delle organizzazioni sociali e delle relazioni umane, e da cui emerge una figura ben diversa da quella classica tratteggiata dalle correnti dominanti del marxismo novecentesco.

Questi studi dimostrano inequivocabilmente l’attualità della visione marxiana e mettono in evidenza alcuni aspetti oggi più cogenti che mai, riassunti lucidamente nella prefazione al volume firmata da Musto. Marx è stato infatti un autore “capace di esaminare le contraddizioni della società capitalistica su scala globale, ben oltre il conflitto tra capitale e lavoro”. Egli affrontò in modo innovativo i problemi oggetto delle sue ricerche, mettendo a punto un sistema di analisi della società che gli permise di cogliere delle caratteristiche tutt’oggi riscontrabili, come la degradazione a mero oggetto dell’essere umano nel sistema capitalistico e la sua conseguente alienazione, la tendenza all’automazione, il feticismo delle merci, l’idea del capitalismo non come mero sistema di produzione, ma come “ordine” sociale che pone vincoli concreti e pratici sulle vite, sugli atteggiamenti e sui modi di pensare delle persone. Egli colse e concettualizzò la separazione formale tra economia e politica, peculiare del capitalismo, che permette di confinare la democrazia in un dominio astratto, lasciando intatte le disuguaglianze in termini di ricchezza; la ridefinizione del ruolo dello Stato e delle funzioni della politica, con la modernissima concezione per cui le politiche pubbliche degli Stati nazionali dovrebbero privilegiare la “soddisfazione dei bisogni collettivi”, assicurare a tutti il diritto alla salute, “il tempo per un’educazione da esseri umani, per lo sviluppo intellettuale, per l’adempimento di funzioni sociali, per rapporti socievoli, per la libera espressione delle energie vitali, fisiche e mentali”, come egli scriveva.

È inoltre poco noto che Marx assegnò grande rilevanza alla questione ecologica; che si interessò diffusamente di fenomeni migratori, dimostrando come gli esodi forzati, generati dal capitalismo, costituissero un elemento rilevante dello sfruttamento delle masse lavoratrici; che si occupò in modo approfondito di numerose altre tematiche, sottovalutate – quando non ignorate – da molti dei suoi studiosi, “che rivestono un’importanza cruciale anche nell’agenda politica dei nostri giorni”, come la relazione tra democrazia e libertà individuale, l’eguaglianza di genere, la critica dei nazionalismi, l’analisi delle guerre e delle relazioni internazionali, il riconoscimento del ruolo distruttivo del colonialismo.

Oltre al recupero e all’aggiornamento dei sistemi elaborati dal filosofo di Treviri, si è poi aperto un campo di studi molto fecondo delle sue idee alla luce dei mutamenti successivi alla sua scomparsa. Come scrive Musto, “andrebbero nuovamente indagate le riflessioni di Marx sulla società comunista quale ‘associazione di liberi esseri umani’”. Perché, ad un attento studio, “l’idea di società di Marx è l’antitesi dei totalitarismi sorti in suo nome nel XX secolo”, e le sue concezioni si rivelano ancora molto utili non solo per comprendere la società capitalista, “ma anche per individuare le ragioni del fallimento delle esperienze socialiste sin qui compiute”.

Insomma, Karl Marx ricorda i gatti, di cui si dice abbiano sette vite. In realtà, la sua periodica riscoperta e fama mediatica si devono al fatto che molte delle tendenze da lui indagate si sono ripresentate puntualmente, proprio quando le si dava per morte e sepolte. Dopo oltre trent’anni dalla caduta del Muro di Berlino è dunque oggi possibile recuperare un Marx ben differente da quello dogmatico, economicista ed eurocentrico che a lungo ha dominato la scena, e questo volume si rivela uno strumento invero prezioso per riavvicinare la sua figura a quanti ritengono che ormai sia stato detto tutto sulla sua opera, e, soprattutto, per presentare un formidabile pensatore a una nuova e più aperta generazione di lettori. Fare tesoro dei suoi studi, delle sue insostituibili armi critiche per cercare di cambiare lo status quo è un imperativo categorico per chiunque abbia a cuore la messa a punto di un sistema alternativo al capitalismo illiberale e distruttivo che governa il mondo, la creazione di società più giuste ed equilibrate, nella sfera dei diritti come in quella dell’accesso alle risorse economiche, con la salvaguardia della salute di tutti e degli ecosistemi che ci consentono la vita. Progetto quanto mai urgente, alla luce dell’esperienza drammatica della pandemia.

Perché, al di là delle sterili dispute ideologiche, qui è in gioco il futuro della specie umana.

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Engels 200 años después: Contribuciones y limitaciones del ‘segundo violín’

Friedrich Engels comprendió la centralidad de la crítica de la economía política incluso antes que Karl Marx. Cuando ambos se conocieron, él había publicado muchos más artículos que su amigo, que estaba destinado a ser famoso en esta disciplina. Era un joven muy prometedor, pero su padre, un industrial textil de Wuppertal, le había negado la posibilidad de estudiar en la universidad para orientarlo hacia su propia profesión. Se había formado a sí mismo, gracias a un voraz apetito de conocimiento, y, para evitar conflictos con una familia conservadora y fuertemente religiosa, firmó sus escritos con seudónimo. Abrazó el ateísmo y los dos años en Inglaterra, a la edad de veintidós años, cuando fue enviado a trabajar a Manchester en las oficinas de la fábrica de algodón Ermen & Engels, fueron decisivos para la maduración de sus convicciones políticas. Fue durante ese período cuando pudo observar de primera mano los efectos de la privatización, la explotación capitalista del proletariado y la competencia entre los individuos. Entró en contacto con el movimiento Cartista y se enamoró de una obrera irlandesa, Mary Burns, que fue decisiva en su formación. Brillante periodista, publicó en Alemania relatos de las luchas sociales inglesas y escribió en la prensa anglosajona sobre el progreso social que tenía lugar en el continente.

En 1845 publicó su primer libro, La situación de la clase obrera en Inglaterra. En el subtítulo subrayó que se había basado en “observaciones directas y fuentes auténticas” y que su propósito respondía a “la necesidad indispensable de dar fundamentos sólidos a las teorías socialistas”: el conocimiento real de las condiciones de trabajo y de vida del proletariado. Fue un precursor de las investigaciones sobre los trabajadores. En las páginas introductorias de su libro afirmó que escribirlo le había ayudado a “comprender la realidad de la vida” y expresó su reconocimiento a los trabajadores ingleses que “nunca lo habían tratado como a un extranjero”, ni lo habían discriminado, ya que no estaban presos de “la terrible maldición de los prejuicios nacionales”. Ese mismo año, después de la publicación de La Sagrada Familia, la primera obra escrita con Marx, Engels se reunió en Inglaterra con su amigo, a quien pudo mostrar lo que había visto y comprendido antes que él. Marx abandonó definitivamente la crítica de la filosofía post-hegeliana y se embarcó en el largo viaje que, más de veinte años después, desembocaría en la publicación de El Capital.

En 1849, Engels regresó a Inglaterra y, como Marx, permaneció allí hasta su muerte. Se convirtió en el “segundo violín”, como se llamaba a sí mismo, y para mantenerse y ayudar a su amigo, que a menudo estaba sin trabajo, aceptó dirigir la fábrica de su padre en Manchester hasta 1870. Sin embargo, incluso durante esos veinte años, nunca dejó de escribir. En 1850 publicó La Guerra de los Campesinos en Alemania, una historia de las rebeliones que tuvieron lugar en 1524-25, con el objetivo de mostrar hasta qué punto el comportamiento de aquella clase media había sido similar al de la pequeña burguesía durante la revolución de 1848-49 y hasta qué punto era igualmente responsable de las derrotas que se produjeron. También escribió casi la mitad de los 500 artículos firmados por Marx para el New York Tribune entre 1851 y 1862, que describieron al público americano las muchas guerras que tuvieron lugar en Europa durante esa década. Frecuentemente pudo anticipar algunos de los acontecimientos y prever las estrategias militares utilizadas en los distintos frentes de la lucha. Eso le valió el apodo por el que todos sus compañeros de partido le conocían: “el General”. Su actividad como publicista continuó durante mucho tiempo y sus Notas sobre la Guerra Franco-Prusiana de 1870-71, una crónica analítica en sesenta artículos sobre los acontecimientos militares que precedieron a la Comuna de París, publicada en el periódico inglés Pall Mall Gazette, le ganaron numerosas felicitaciones y dan testimonio de su perspicacia en la materia.

En los quince años siguientes, Engels hizo sus principales aportaciones teóricas también a través de escritos ocasionales, nacidos para oponerse a las tesis de los opositores políticos dentro del movimiento obrero o para explicar las controversias surgidas en el debate teórico. El Anti-Dühring, que apareció en 1878, que él definió como “la exposición más o menos unitaria del método dialéctico y la visión comunista del mundo”, se convirtió en una referencia crucial para la formación de la doctrina marxista. Aunque hay que distinguir entre la popularización realizada por Engels, en abierta polémica con los atajos simplistas en boga en su época, y la vulgarización realizada por la generación posterior de la socialdemocracia alemana, su recurso a las ciencias naturales abrió el camino a una concepción evolutiva de los fenómenos sociales que simplificaba el análisis más polifacético de Marx. Del socialismo utópico al socialismo científico, una reelaboración de tres capítulos del Anti-Dühring con fines divulgativos, tuvo incluso más exito que el texto original. A pesar de los méritos de este escrito, que circuló casi tanto como el Manifiesto del Partido Comunista, las definiciones de “ciencia” y “socialismo científico” propuestas por Engels pueden considerarse como un ejemplo de autoritarismo epistemológico y fueron utilizadas posteriormente por la vulgata marxista-leninista para excluir cualquier tipo de discusión crítica de las tesis de los “fundadores del comunismo”. La Dialéctica de la Naturaleza, un proyecto a base de fragmentos en el que Engels trabajó, con numerosas interrupciones de 1873 a 1883, ha sido objeto de una gran diatriba. Para algunos era la piedra angular del marxismo, para otros la piedra angular del nacimiento del dogmatismo soviético. Hoy en día debe ser releído como una obra incompleta, que muestra los límites de Engels, pero también el potencial contenido en su crítica ecológica. Si el método dialéctico que utilizó simplificó y redujo ciertamente la complejidad teórica y metodológica de Marx, no es correcto, sin embargo, como se observó superficialmente y sin generosidad en el pasado, hacerle responsable de todo lo que no gustaba de los escritos de su amigo y echar sólo sobre sus hombros las causas de los errores teóricos e incluso de las derrotas prácticas.

En 1884 Engels publicó El origen de la familia, la propiedad privada y el Estado, un análisis de los estudios antropológicos realizados por el estadounidense Lewis Morgan. Morgan había descubierto que las relaciones matriarcales eran anteriores a las patriarcales. Para Engels esta revelación fue tan importante para la historia de los orígenes de la humanidad como la “teoría de la evolución de Darwin para la biología y la teoría de la plusvalía de Marx para la economía política”. La familia ya contenía los antagonismos que más tarde se desarrollarían en la sociedad y el estado. Según Engels, la primera opresión de clase que aparece en la historia “coincide con la del sexo femenino por el sexo masculino”. En materia de igualdad de género, así como en lo que respecta a las luchas anticoloniales, nunca dudó en tomar partido y defender, sin decididamente, la causa de la emancipación.

Durante los doce años en los que sobrevivió a Marx, se dedicó a la publicación del legado de Marx y a la dirección del movimiento obrero internacional. No sólo logró imprimir los manuscritos del segundo y tercer libro de El Capital, sino que también publicó varias reediciones de obras ya conocidas. En la nueva introducción de una de ellas, Las luchas de clases en Francia, compuesta unos meses antes de su muerte, Engels elaboró una teoría de la revolución que se adaptaba al nuevo escenario político europeo. El proletariado se había convertido en mayoría y la toma del poder por medios electorales, gracias al sufragio universal, permitiría defender tanto la revolución como la legalidad. Esto no significaba – como sugirieron los socialdemócratas alemanes que manipularon el texto en un sentido legalista y reformista – que la “pelea en las calles” ya no tuviera ninguna función. Significaba que no se podía pensar en la revolución sin la participación activa de las masas y que esto requería “un trabajo largo y paciente”. Leyendo a Engels y observando el estado del capitalismo contemporáneo, nace el deseo de empezar de nuevo y retomar esa vía.

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Il “generale” femminista

Friedrich Engels comprese la centralità della critica dell’economia politica ancor prima di Karl Marx.

Quando i due si conobbero, egli aveva pubblicato molti più articoli di quelli dati alle stampe dall’amico destinato a diventare celebre in questa disciplina. Era un giovane molto promettente, al quale il padre, un industriale tessile di Wuppertal, aveva negato, però, la possibilità di studiare all’università per indirizzarlo alla sua stessa professione. Si era formato da solo, grazie a una vorace fame di sapere, e, per evitare conflitti con una famiglia conservatrice e fortemente religiosa, firmava i suoi scritti con uno pseudonimo. Divenne ateo e i due anni trascorsi in Inghilterra, quando, ventiduenne, fu mandato a lavorare a Manchester, negli uffici del cotonificio Ermen & Engels, furono decisivi per la maturazione delle sue convinzioni politiche. Fu in quel periodo che osservò di persona gli effetti delle privatizzazioni, dello sfruttamento capitalistico sul proletariato e della concorrenza tra gli individui. Entrò in contatto con il movimento cartista e s’innamorò di un’operaia irlandese, Mary Burns, che fu determinante per la sua formazione. Brillante giornalista, pubblicò in Germania i resoconti delle lotte sociali inglesi e scrisse sulla stampa anglofona dei progressi sociali in atto nel continente.

Nel 1845 pubblicò il suo primo libro, La situazione della classe operaia in Inghilterra. Nel sottotitolo tenne a sottolineare che esso era stato basato su “osservazioni dirette e fonti autentiche” e che aveva avuto come intento “una necessità imprescindibile per dare solide fondamenta alle teorie socialiste”: la reale conoscenza delle condizioni lavorative e di vita dei proletari. Fu un precursore delle inchieste operaie. Nelle pagine introduttive del suo scritto, affermò che la sua realizzazione l’aveva aiutato a “comprendere la realtà della vita” ed espresse il suo riconoscimento verso i lavoratori inglesi che non l’avevano “mai trattato come uno straniero”, né mai discriminato, poiché su di loro non ricadeva la “terribile maledizione dei pregiudizi nazionali”. In quello stesso anno, dopo la pubblicazione di La sacra famiglia, la prima opera scritta assieme a Marx, Engels si recò in Inghilterra con l’amico, al quale ebbe modo di mostrare quanto aveva visto e compreso prima di lui. Marx abbandonò definitivamente la critica della filosofia post-hegeliana per intraprendere quel lungo viaggio che, oltre vent’anni dopo, si sarebbe compiuto con la pubblicazione di Il capitale.

Nel 1849, Engels ritornò in Inghilterra e, come Marx, vi rimase fino alla sua morte. Divenne il “secondo violino”, come lui stesso si definì, e per sostenersi e poter soccorrere l’amico, frequentemente senza lavoro, accettò di dirigere la fabbrica del padre, a Manchester, fino al 1870. Anche durante questo ventennio, però, non smise mai di scrivere.

Nel 1850 pubblicò La guerra dei contadini in Germania, una storia delle ribellioni avvenute nel biennio 1524-25, volta a mostrare quanto il comportamento della classe media di quel tempo fosse stato simile a quello della piccola borghesia durante la rivoluzione del 1848-49 e quanto egualmente responsabile delle sconfitte avvenute. Redasse, inoltre, quasi la metà dei 500 articoli firmati da Marx per il New-York Tribune tra il 1851 e il 1862, raccontando al pubblico americano le tante guerre susseguitesi in Europa durante quel decennio. Non di rado, seppe anticiparne alcuni sviluppi e prevedere le strategie militari utilizzate dai diversi fronti in lotta. Ciò gli valse il soprannome con il quale era noto a tutti i compagni di partito: “il generale”. La sua attività di pubblicista continuò a lungo e le sue Note sulla guerra franco-prussiana del 1870-71, una cronaca analitica in sessanta articoli degli eventi militari che precedettero la Comune di Parigi, pubblicata sul quotidiano inglese Pall Mall Gazette, servì a procurargli numerosi apprezzamenti e testimoniano la sua perspicacia in materia.

Nel quindicennio che seguì, Engels realizzò i suoi principali contributi teorici esponendo le sue idee anche attraverso scritti occasionali, nati per contrastare le tesi di avversari politici all’interno del movimento operaio o al fine di fornire delucidazioni in merito a controversie insorte nel dibattito teorico. L’Anti-Dühring, apparso nel 1878, da lui definito la “esposizione più o meno unitaria del metodo dialettico e della visione comunista del mondo”, divenne un riferimento cruciale per la formazione della dottrina marxista. Seppure occorra distinguere tra la popolarizzazione compiuta da Engels, in aperta polemica con le scorciatoie semplicistiche in voga al suo tempo, e la volgarizzazione operata dalla successiva generazione della socialdemocrazia tedesca, il suo ricorso alle scienze naturali aprì la strada a una concezione evoluzionistica dei fenomeni sociali che sminuì la più poliedrica analisi di Marx. L’evoluzione del socialismo dall’utopia alla scienza, rielaborazione a fini divulgativi di tre capitoli dell’Anti-Dühring, ebbe ancora maggior fortuna del testo originario. Nonostante i pregi di questo scritto, che circolò quasi quanto il Manifesto del partito comunista, le definizioni di “scienza” e “socialismo scientifico” proposte da Engels possono essere considerate come un esempio di autoritarismo epistemologico e furono successivamente utilizzate dalla vulgata marxista-leninista per precludere ogni tipo di discussione critica delle tesi dei “fondatori del comunismo”. La Dialettica della natura, un progetto rimasto in frammenti al quale Engels lavorò, con numerose interruzioni, dal 1873 al 1883, fu oggetto di una grande diatriba. Per alcuni si trattò della pietra angolare del marxismo, per altri dello scritto reo della nascita del dogmatismo sovietico. Oggi va riletto nella sua incompiutezza, mostrando i limiti di Engels, ma anche le potenzialità contenute nella sua critica ecologica. Se il metodo dialettico da lui utilizzato ha certamente semplificato e ridotto la complessità teorica e metodologica di Marx, non è corretto, però, come è stato superficialmente e ingenerosamente osservato in passato, ritenerlo responsabile di tutto quello che non piaceva degli scritti del suo amico e scaricare soltanto sulle sue spalle le cause degli errori teorici e, finanche, delle sconfitte pratiche.

Nel 1884 Engels pubblicò L’origine della famiglia, della proprietà privata e dello Stato, un’analisi degli studi antropologici condotti dall’americano Lewis Morgan. Questi aveva scoperto che i rapporti matriarcali erano anteriori a quelli patriarcali. Per Engels questa rivelazione era importante per la storia delle origini dell’umanità tanto quanto lo erano state la “teoria dell’evoluzione di Darwin per la biologia e la teoria del plusvalore di Marx per l’economia politica”. Nella famiglia erano già contenuti gli antagonismi che si sarebbero successivamente sviluppati nella società e nello Stato. Secondo Engels, la prima oppressione di classe comparsa nella storia “coincide con quella del sesso femminile da parte di quello maschile”. In materia di eguaglianza di genere, così come rispetto alle lotte anticoloniali, egli non esitò mai a prendere parte e sposò, convintamente, la causa dell’emancipazione.

Nel corso dei dodici anni nei quali sopravvisse a Marx, si dedicò alla pubblicazione del lascito di quest’ultimo e alla direzione del movimento operaio internazionale. Non solo riuscì a dare alle stampe i manoscritti dei libri Secondo e Terzo di Il capitale, ma ristampò anche diverse riedizioni di opere già note. Nella nuova introduzione a una di queste, Le lotte di classe in Francia, composta pochi mesi prima della sua morte, Engels elaborò una teoria della rivoluzione che si adattava al nuovo scenario politico europeo. Il proletariato era divenuto maggioranza e la presa del potere per via elettorale, grazie al suffragio universale, avrebbe consentito di difendere, al contempo, la rivoluzione e la legalità. Questo non voleva dire – come suggerito dai socialdemocratici tedeschi che manipolarono il testo in senso legalitario e riformistico – che la “lotta di strada” non aveva più alcuna funzione. Significava che la rivoluzione non poteva essere pensata senza la partecipazione attiva delle masse e che ciò richiedeva “un lavoro lungo e paziente”. Leggendo Engels e osservando lo stato in cui versa il capitalismo contemporaneo, nasce la voglia di ricominciare e intraprendere di nuovo quel cammino.

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Daniel Whittall, Review 31

A Restless Thinker

In the millions of pages written about Karl Marx, his final years have been somewhat neglected.

Sven-Eric Liedman’s biography A World to Win, published in English translation in 2018, assesses Marx’s late notebooks and correspondence on Russia in depth but gives limited attention to the other aspects of Marx’s latter years, including his important trip to Algeria. Mary Gabriel’s excellent Love and Capital: Karl and Jenny Marx attends to the later years but nevertheless treats Algeria briefly and gives little sense of the broader development of Marx’s thought. In Karl Marx: Greatness and Illusion, Gareth Stedman Jones considers Marx’s late interest in Russia at some length, but dismisses the rest of Marx’s last three years by suggesting it ‘was a period entirely dominated by anxieties about health, both his own and that of various members of the family.’ Jonathan Sperber, in Karl Marx: A Nineteenth Century Life, does better, again assessing Marx’s work on Russia but also giving only a page to the Algeria trip and focusing, for the final year and a half or so, almost entirely on matters of Marx’s health.

There is scope, then, for a revaluation of Marx’s last few years. Marcelo Musto has familiarised himself deeply with the works of Marx and Engels, including correspondence, notebooks and a wealth of other materials. By reading this work closely and contextualising it with the deep knowledge and critical understanding of the secondary literature evident in his earlier book Another Marx, he has produced a study that breaks new ground in our understanding of Marx between 1881 and 1883, though it also leaves a number of important questions unasked. The Marx of his final years becomes, in Musto’s telling, a restless thinker driven forwards by uncertainty and doubt to voraciously devour, synthesise and apply anew ideas from a dizzying range of fields in the pursuit of a better world.

Living in North London in 1881, the 63-year-old Marx produced a vast quantity of largely unpublished work in spite of his own and his family’s ill health. In the first half of 1881 he completed his so-called Ethnological Notebooks, consisting of over 200 pages of notes based on readings about non-Western and pre-capitalist societies. Simultaneously he worked on his Mathematical Notebooks, producing a detailed study of differential calculus. For Marx maths was both a tool to aid his analysis and understanding of the world and, especially in his later years, an important way to relax while maintaining an active pattern of thought when too drained to read or write at length. In the latter part of 1881 Marx also completed his astonishing Chronological Extracts, containing an astounding 550 pages of extracts and annotations on world history beginning in 91 BC and running through to the Treaty of Westphalia in 1648.

Marx took particular interest in the USA during these years. Writing of California in 1880, he noted that ‘in no other place had revolution by capitalist centralisation been effected with such effrontery at such great speed,’ and Musto suggests that had Marx been able to revise Volume 1 of Capital in these years he would have added more on the USA. He read the American economist Henry George’s 1879 book Progress and Poverty, which proposed a single tax on land value to replace all other taxes. Marx dismissed George’s arguments because of the ‘revolting presumptuousness and arrogance’ of their author, and he had no time for the misguided belief that mere changes in taxation might eradicate all the ‘abuses of capitalist production.’

Beyond America, Marx’s correspondence of 1881-82 shows him attending deeply to events in as diverse a range of places as India, Ireland, and France. Nonetheless, it was Russia that stimulated the greatest re-thinking. Through the 1870s Marx corresponded with leading Russian scholars and he later reflected that ‘in order to reach an informed judgement on economic development in Russia, I learned Russian and then for many years studied official and other publications.’ He was particularly taken by the works of the Russian economist Nikolai Chernyshevsky, who he deemed to be ‘a great Russian scholar and critic’ and whose economic works he judged to be ‘excellent.’ Chernyshevsky was especially valuable for Marx in his focus on the obshchina, or peasant village community. As both the Ethnological Notebooks and Chronological Extracts testify, Marx was deeply interested in archaic and pre-capitalist forms of community. Chernyshevsky’s suggestion that the obshchina could be turned in a socialist direction as part of a broader transformation of the productive forces, rather than inevitably abandoned in the face of capitalist industrialisation, was of great importance to Marx’s late thought.

Though he is often characterised as a thinker for whom history passes progressively and inevitably along a series of linear transitions, his late interest in Russia shows Marx himself challenging those who framed Russian history, and the future of the obshchina, in these terms. He was angered by the writings of Nikolai Mikhailovsky, a liberal critic and sociologist, who he felt had tried to transform his arguments into ‘a historico-philosophical theory of the general course fatally imposed on all peoples, whatever the historical circumstances in which they [found] themselves.’ Marx wrote a long letter, which he ultimately never sent, setting out his belief that ‘events of striking similarity, taking place in different historical contexts, [lead] to totally different results,’ and outlining his opposition to the idea that a ‘supra-historical’ theory might act as a ‘master-key’ with which to unlock all historical and political uncertainties. When he wrote a famous letter to the activist Vera Zasulich, at her request, on these matters in which he argued that it was possible to incorporate the obshchina as part of a transition to socialism — he described it as being ‘the fulcrum of social regeneration in Russia’ — the letter was kept unpublished because of the importance it may have had to factional disputes within the Russian socialist movement of the time. Misreadings of Marx that insist he proposed a single linear framework for the development towards socialism find one of their origin-points in this moment.

When the second edition of Volume 1 of Capital sold out in 1881, Marx’s German publisher requested that he consider making amendments for a third edition. Marx, though, preferred to focus on completing Volume 2. In the event, neither were possible, and Musto suggests three reasons. First, his German publishers advised that recent changes in the law would make it impossible for the book to be published. Nevertheless, Musto notes that Marx took this apparently bad news surprisingly well, no doubt due to the second reason: at the onset of the 1880s he was waiting to see how an industrial crisis in Britain would be resolved, and his interest in matters in Russia and the USA were becoming increasingly transformative. Changing circumstances in these countries, and Marx’s own evolving ideas, drove him to recognise that ‘certain economic phenomena’ were ‘entering upon a new phase of development and call[ed] for fresh appraisal.’

Marx’s inability to complete Volume 2 was compounded by the third reason — his and his families’ deteriorating health. Marx’s wife Jenny got more unwell as 1881 progressed, and the couple travelled extensively in the hope of finding rest and recuperation. Meanwhile, Marx spent much of the late summer of 1881 caring for his third daughter Eleanor, who had become gravely ill. A strength of Musto’s book is that he demonstrates the immense importance Marx placed on his family and their wellbeing in these years. Marx’s wife Jenny died of liver cancer in December 1881, and he was left doubly bereft when he was pronounced too ill to attend the funeral of his ‘greatest treasure’ by doctors.

Musto’s account of Marx’s trip to Algeria in the first half of 1882 is more comprehensive than anything to be found in the clutch of recent English-language biographies, and reads the trip in the context of the Chronological Notebooks on which Marx was then working. We see Marx hoping to study in more depth questions of communal land ownership in the region, but we also learn more of the debilitating impact his health was having on his capacity to think, read and write in depth and with clarity. Musto explores those of Marx’s observations on Algeria that ‘display a still partly colonial vision,’ whilst also showing how the trip saw Marx criticising the European colonial treatment of Algerians and, in particular, the racist policing experienced by the Arab and north African population at the hands of the colonial powers.

Marx’s Algeria trip matters because it is such an intriguing final journey for him to have taken. Musto helps us to understand the motivations for the trip — largely pushed by Engels, who appears to have seen it as a last great hope for the improvement of his friend’s health as well as an opportunity for Marx to study ‘common ownership among the Arabs’. But we also get a sense of Marx’s loneliness, the ongoing hurt he felt at the loss of his wife, the sense of regret he felt about what he would come to call his ‘ill-calculated expedition’ and the arduous nature of the medical treatments he underwent there. The Marx we find in Musto’s account of his Algeria trip – and the three weeks spent in Monaco on the way back in which he evaluated the place of the casino as the ‘economic basis of Monaco’ frequented by ‘aristocratic idlers or adventurers’ — is a more vulnerable, more human Marx than those we find in many other biographies.

Recuperating on the Isle of White in early 1883, Marx received his final piece of devastating news when his daughter Jenny died in Paris. He left for London, only to be confined to the house on health grounds. He set his last known words to paper in a letter to his doctor on 13th January, and would die of heart failure on the 14th March 1883.

Though Musto’s book is the most detailed account to date of these final years, it remains itself curiously incomplete. Musto promises future works that will explore in greater depth both Marx’s Ethnological Notebooks and his Chronological Extracts, and these will be keenly awaited by any reader of The Last Years of Karl Marx. Perhaps more disappointing is the brevity of the treatment of Marx’s attitude to ecology, treated to just over a page here. Musto notes that it was in Marx’s last years that he developed a friendship with Edwin Ray Lankester, an Oxford zoologist who read Capital and engaged with Marx in what Musto describes as a ‘prolific intellectual exchange.’ Yet the content or implications of this exchange is not explored. That this is a loss to the picture that Musto paints of Marx’s final years will be clear to readers of John Bellamy Foster’s recently published book The Return of Nature. Foster suggests that Marx and Lankester’s intellectual exchange was based on sharing a dialectical approach to science, a fierce opposition to eugenics, and a ‘thoroughgoing materialism’ in their approach to social questions.

Nevertheless, in attending closely to Marx’s ideas as they emerged through his theoretical studies, his attentiveness to economic and international events, and his extensive correspondence, Musto gives us a portrait of a thinker in his last years that challenges the representations others have imposed upon him. Instead of the strict determinist for whom economic circumstances dictated all else, what emerges is an attentive and responsive student of the world who ‘spurned any rigid linking of social changes to economic transformations alone.’ Instead of a believer in the natural and inevitable progress from one mode of production to another, Musto’s Marx is a thinker who attends to ‘the specificity of historical conditions, the multiple possibilities that the passing of time offered, and the centrality of human intervention in the shaping of reality and the achievement of change.’

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Salvador Medina, Goodreads

Este libro de Marcello Musto trata sobre los últimos dos años de vida de Karl Marx, de 1881 a 1883.

En esta obra, Musto escribe sobre los temas que investigaba Marx y cómo se entrelazaban con su vida política y vida personal. Lo que consiste en una revalorización de la última etapa de su vida. El libro está dividido en 5 capítulos y un epílogo, con un lenguaje sencillo y de fácil comprensión.

El primero trata sobre las investigaciones que realizaba en torno a la antropología y las matemáticas. Una muestra de los grandes intereses de Marx por investigar diversas cuestiones, que pasaban por el rol de la familia, la mujer, el racismo, el colonialismo, hasta el cálculo diferencial. Las investigaciones de corte antropológico (Los apuntes etnológicos) tenían el fin de profundizar la crítica de la economía política, mientras que su estudio de las matemáticas (Los manuscritos matemáticos) pareciese que era más de curiosidad intelectual y corte lúdico – pues sostenía que estos le permitían conservar la “tranquilidad de su mente”.

El segundo capítulo trata sobre sus estudios del desarrollo capitalista en Rusia y la posibilidad de que las comunas agrícolas pudieran ser la base para el comunismo, resultado de una consulta de la escritora rusa Vera Zasulich. Negando el determinismo económico de que el caso inglés era aplicable a toda nación o pueblo. Dejando por lo tanto abierta la posibilidad de que en Rusia se generase una revolución de corte comunista.

En el capítulo tres, trata más sobre su vida personal y la difusión de su obra. Las discusiones sobre El Capital comienzan en Europa, pero aún tienen que competir con otros autores populares en su momento y con las mal interpretaciones de su obras (además de la cesura de la época). Al mismo tiempo, él y su familia padecen problemas de salud, en especial su esposa que fallecería en 1881.

En el último capítulo, trata sobre los últimos viajes que realizó debido a una bronquitis, para lo cual los doctores le recomendaron viajar a climas más calurosos, incluyendo el viaje a Argelia en 1882. Estos viajes no ayudaron en su recuperación, incluso podrían haberlo perjudicado porque las condiciones temporales no fueron favorecedoras (y la medicina del momento no atacaba de raíz el problema de su enfermedad). Posteriormente a la muerte de su hija de cáncer, el estado de su salud se agravaría y Marx fallecería en marzo de 1883, dejando muchas discusiones y trabajos inconclusos.

Sin duda retrata la parte humana de Marx, el amor a su familia, su compromiso con la investigación y la lucha obrera. Karl Marx dejaría una obra de análisis de capitalismo sin paragón y un mensaje de organización de los trabajadores para poner fin a su explotación.

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João Céu e Silva, Diário de Notícias

“O Marx ecologista, esse desconhecido”

Se em O Outro Marx, o professor de Teoria Política da universidade canadiana de York, Marcello Musto, tinha investigado o jovem Karl Marx, o seu último trabalho é sobre o tempo oposto: Os Últimos Anos de Marx.

Publicado recentemente em Portugal, é uma investigação que surpreende tanto os fãs como os detratores do cientista político mais polémico desde o século XIX e permite conhecer os seus últimos anos de vida e os interesses filosóficos menos divulgados.

Musto tem dedicado vários livros à interpretação da obra de Marx e analisado a contemporaneidade das suas teorias em publicações traduzidas para mais de uma dezena e meia de línguas. A propósito deste novo livro sobre Karl Marx diz: “Não é um pensador sobre quem tudo já foi escrito e dito. Ainda há muito a descobrir sobre ele.”

Finaliza esta biografia a referir a fotografia em que Marx surge sem a barba e com o cabelo curto. Pretende humanizá-lo?
É uma história engraçada, e Marx era um homem com um grande sentido de humor. Em 1882, ele foi para Argel com a esperança de que o bom tempo melhorasse a sua frágil saúde. Antes de sair, ele escreveu numa carta a Engels: “Acabei com a minha barba de profeta e a minha glória coroada, mas fotografei-me antes de sacrificar o meu cabelo a um barbeiro argelino.” Esta foi a sua última foto.

O Marx dos últimos tempos complementa o filósofo que todos conhecem ou acrescenta outra versão ligeiramente diferente?
Nos primeiros escritos de Marx encontram-se muitas ideias que foram substituídas nos seus trabalhos posteriores. É sobretudo em O Capital e nos seus rascunhos preliminares, bem como nas pesquisas dos seus últimos anos, que encontramos as reflexões mais preciosas sobre a crítica da sociedade burguesa. Estas representam as últimas, embora não definitivas, conclusões a que Marx chegou.

Este retrato de Marx mostra um cidadão muito mais frágil e dependente do que já conhecíamos. Não o diminui para a posteridade?
O “último” Marx é também o Marx mais íntimo: não escondeu a sua fragilidade face à vida, mas continuou a lutar; não se furtou à dúvida, mas confrontou-a abertamente; optou por prosseguir com a sua investigação em vez de se refugiar na autocerteza e lapidar a adulação acrítica dos primeiros “marxistas”. Não é uma diminuição.

A recuperação de Marx para a atualidade fica mais fácil com o fim da sua ligação ao marxismo-leninismo que vigorou na URSS e às grandes crises financeiras já deste século?
O colapso do dogmático e autoritário “socialismo realmente existente” da União Soviética, juntamente com a instabilidade e a imprevisibilidade persistente dos mercados globais, obrigaram vários economistas, incluindo muitos que se opunham a Marx, a revisitar as suas ideias. Com o desenvolvimento do capitalismo à escala global – e num sistema que invade e permeia a maioria dos aspetos da vida humana – a análise atual de Marx revela o seu significado de uma forma mais clara do que no seu tempo.

Dá-nos um Marx ecológico. Ele gostaria de aparecer deste modo em vez do autor de O Capital e de outros ensaios mais filosóficos?
Nos últimos anos, surgiu uma nova – e de muitas formas surpreendente – exploração do Marx político. As suas reflexões sobre temas que são cruciais na agenda política contemporânea são novamente lidas. Estes temas incluem migração, nacionalismo ou ecologia. Muitos livros recentes mostraram a importância que Marx atribuía à questão ecológica. Em repetidas ocasiões, denunciou o facto de que a expansão do modo de produção capitalista aumentava não só o roubo do trabalho operário, mas também a pilhagem dos recursos naturais.

Ao dedicar-se a questões mais abrangentes, como a da antropologia e a do colonialismo, Marx poderia ter alterado certos princípios fundamentais na sua obra se vivesse mais tempo, ou apenas os reforçaria?
Nesse período, Marx fez progressos notáveis em relação à antropologia, e aprofundou muito a questão colonial. Ele era tudo menos eurocêntrico, economista ou fixado apenas no conflito de classes. Marx considerou fundamental o estudo de novos conflitos políticos, novos temas e áreas geográficas na sua crítica contínua ao sistema capitalista. Permitiu-lhe abrir-se às especificidades nacionais e considerar a possibilidade de uma abordagem ao comunismo diferente da que tinha sido desenvolvida anteriormente.

Os últimos anos da sua vida nunca foram “divulgados”. Este Marx velho não o desiludiu?
Pelo contrário, em 1881 e 1882, Marx estudou os modos pré-capitalistas de produção, as sociedades não ocidentais, a revolução socialista e a conceção materialista da história. Ele também observou de perto os principais acontecimentos na política internacional, como podemos ver nas suas cartas, expressando um apoio firme à luta de libertação irlandesa e ao movimento populista na Rússia, e uma oposição firme à opressão colonial britânica na Índia e no Egito e ao colonialismo francês na Argélia. Foi um Marx verdadeiramente global.

Acha que fechou a biografia de Marx ou apenas abriu uma porta?
A publicação na Marx-Engels-Gesamtausgabe, a nova edição histórico-crítica das obras completas de Marx e Engels, dos antes desconhecidos materiais de Marx, juntamente com a interpretação inovadora da sua obra, abriu novos horizontes de investigação e demonstrou, mais claramente do que no passado, a sua capacidade de examinar as contradições da sociedade capitalista à escala global e em esferas que ultrapassam o conflito entre o capital e o trabalho. Não é exagero dizer que, dos grandes clássicos do pensamento político, económico e filosófico, Marx é aquele cujo perfil mudou mais nas décadas iniciais do século XXI. Uma biografia monumental ainda terá de ser escrita. Marx não é um pensador sobre quem tudo já foi escrito e dito. Ainda há muito a descobrir sobre ele.

Desde a morte de Marx muitas mudanças aconteceram no mundo. Na sua opinião, a sua obra mantém-se atual, mais correta para países em desenvolvimento, ou “morreu” como disseram vários detratores já há umas décadas?
análise das classes sociais de Marx precisa de ser atualizada e a sua teoria da crise económica – que ficou inacabada – é filha de outro tempo. Se em Marx não se consegue encontrar respostas para muitos dos problemas contemporâneos, ele ajuda-nos a identificar as principais contradições. Se analisadas criticamente à luz das mudanças no mundo desde a morte de Marx, estas questões ainda podem revelar-se altamente úteis para a tarefa de teorizar sobre um modelo socioeconómico alternativo ao capitalismo.

Qual o Marx que prefere: o das estátuas do Leste Europeu ou o menos dogmático?
verdadeiro Marx é o segundo. O seu lema favorito era: De omnibus dubitandum. Duvido de tudo.

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O Marx ecologista, esse desconhecido

Se em O Outro Marx, o professor de Teoria Política da universidade canadiana de York, Marcello Musto, tinha investigado o jovem Karl Marx, o seu último trabalho é sobre o tempo oposto: Os Últimos Anos de Marx.

Publicado recentemente em Portugal, é uma investigação que surpreende tanto os fãs como os detratores do cientista político mais polémico desde o século XIX e permite conhecer os seus últimos anos de vida e os interesses filosóficos menos divulgados.

Musto tem dedicado vários livros à interpretação da obra de Marx e analisado a contemporaneidade das suas teorias em publicações traduzidas para mais de uma dezena e meia de línguas. A propósito deste novo livro sobre Karl Marx diz: “Não é um pensador sobre quem tudo já foi escrito e dito. Ainda há muito a descobrir sobre ele.”

 

Finaliza esta biografia a referir a fotografia em que Marx surge sem a barba e com o cabelo curto. Pretende humanizá-lo?
É uma história engraçada, e Marx era um homem com um grande sentido de humor. Em 1882, ele foi para Argel com a esperança de que o bom tempo melhorasse a sua frágil saúde. Antes de sair, ele escreveu numa carta a Engels: “Acabei com a minha barba de profeta e a minha glória coroada, mas fotografei-me antes de sacrificar o meu cabelo a um barbeiro argelino.” Esta foi a sua última foto.

 

O Marx dos últimos tempos complementa o filósofo que todos conhecem ou acrescenta outra versão ligeiramente diferente?
Nos primeiros escritos de Marx encontram-se muitas ideias que foram substituídas nos seus trabalhos posteriores. É sobretudo em O Capital e nos seus rascunhos preliminares, bem como nas pesquisas dos seus últimos anos, que encontramos as reflexões mais preciosas sobre a crítica da sociedade burguesa. Estas representam as últimas, embora não definitivas, conclusões a que Marx chegou.

 

Este retrato de Marx mostra um cidadão muito mais frágil e dependente do que já conhecíamos. Não o diminui para a posteridade?
O “último” Marx é também o Marx mais íntimo: não escondeu a sua fragilidade face à vida, mas continuou a lutar; não se furtou à dúvida, mas confrontou-a abertamente; optou por prosseguir com a sua investigação em vez de se refugiar na autocerteza e lapidar a adulação acrítica dos primeiros “marxistas”. Não é uma diminuição.

 

A recuperação de Marx para a atualidade fica mais fácil com o fim da sua ligação ao marxismo-leninismo que vigorou na URSS e às grandes crises financeiras já deste século?
O colapso do dogmático e autoritário “socialismo realmente existente” da União Soviética, juntamente com a instabilidade e a imprevisibilidade persistente dos mercados globais, obrigaram vários economistas, incluindo muitos que se opunham a Marx, a revisitar as suas ideias. Com o desenvolvimento do capitalismo à escala global – e num sistema que invade e permeia a maioria dos aspetos da vida humana – a análise atual de Marx revela o seu significado de uma forma mais clara do que no seu tempo.

 

Dá-nos um Marx ecológico. Ele gostaria de aparecer deste modo em vez do autor de O Capital e de outros ensaios mais filosóficos?
Nos últimos anos, surgiu uma nova – e de muitas formas surpreendente – exploração do Marx político. As suas reflexões sobre temas que são cruciais na agenda política contemporânea são novamente lidas. Estes temas incluem migração, nacionalismo ou ecologia. Muitos livros recentes mostraram a importância que Marx atribuía à questão ecológica. Em repetidas ocasiões, denunciou o facto de que a expansão do modo de produção capitalista aumentava não só o roubo do trabalho operário, mas também a pilhagem dos recursos naturais.

 

Ao dedicar-se a questões mais abrangentes, como a da antropologia e a do colonialismo, Marx poderia ter alterado certos princípios fundamentais na sua obra se vivesse mais tempo, ou apenas os reforçaria?
Nesse período, Marx fez progressos notáveis em relação à antropologia, e aprofundou muito a questão colonial. Ele era tudo menos eurocêntrico, economista ou fixado apenas no conflito de classes. Marx considerou fundamental o estudo de novos conflitos políticos, novos temas e áreas geográficas na sua crítica contínua ao sistema capitalista. Permitiu-lhe abrir-se às especificidades nacionais e considerar a possibilidade de uma abordagem ao comunismo diferente da que tinha sido desenvolvida anteriormente.

 

Os últimos anos da sua vida nunca foram “divulgados”. Este Marx velho não o desiludiu?
Pelo contrário, em 1881 e 1882, Marx estudou os modos pré-capitalistas de produção, as sociedades não ocidentais, a revolução socialista e a conceção materialista da história. Ele também observou de perto os principais acontecimentos na política internacional, como podemos ver nas suas cartas, expressando um apoio firme à luta de libertação irlandesa e ao movimento populista na Rússia, e uma oposição firme à opressão colonial britânica na Índia e no Egito e ao colonialismo francês na Argélia. Foi um Marx verdadeiramente global.

 

Acha que fechou a biografia de Marx ou apenas abriu uma porta?
A publicação na Marx-Engels-Gesamtausgabe, a nova edição histórico-crítica das obras completas de Marx e Engels, dos antes desconhecidos materiais de Marx, juntamente com a interpretação inovadora da sua obra, abriu novos horizontes de investigação e demonstrou, mais claramente do que no passado, a sua capacidade de examinar as contradições da sociedade capitalista à escala global e em esferas que ultrapassam o conflito entre o capital e o trabalho. Não é exagero dizer que, dos grandes clássicos do pensamento político, económico e filosófico, Marx é aquele cujo perfil mudou mais nas décadas iniciais do século XXI. Uma biografia monumental ainda terá de ser escrita. Marx não é um pensador sobre quem tudo já foi escrito e dito. Ainda há muito a descobrir sobre ele.

 

Desde a morte de Marx muitas mudanças aconteceram no mundo. Na sua opinião, a sua obra mantém-se atual, mais correta para países em desenvolvimento, ou “morreu” como disseram vários detratores já há umas décadas?
análise das classes sociais de Marx precisa de ser atualizada e a sua teoria da crise económica – que ficou inacabada – é filha de outro tempo. Se em Marx não se consegue encontrar respostas para muitos dos problemas contemporâneos, ele ajuda-nos a identificar as principais contradições. Se analisadas criticamente à luz das mudanças no mundo desde a morte de Marx, estas questões ainda podem revelar-se altamente úteis para a tarefa de teorizar sobre um modelo socioeconómico alternativo ao capitalismo.

 

Qual o Marx que prefere: o das estátuas do Leste Europeu ou o menos dogmático?
verdadeiro Marx é o segundo. O seu lema favorito era: De omnibus dubitandum. Duvido de tudo.